quarta-feira, 25 de outubro de 2006
Firmeza de princípios
Um político já eleito estava essa semana num almoço e quis saber a opinião de um funcionário do restaurante. O rapaz manifestou total e radical rejeição a um dos candidatos ao governo, exatamente o apoiado pelo político. Dois ou três minutos durou a opinião do rapaz, até o instante em que o outro manifestou seu apoio. Voto virado é produto fácil.Mudar de opinião por alguma conveniência é próprio do ser humano. E essa conveniência pode ser interesse material, gratidão, medo ou puro oportunismo. Todo mundo muda de opinião, principalmente os três elementos que formam a raça: eleitor, político e imprensa. Na conveniência mais clássica, do interesse, há aquela do pai que esculhamba a filha quando sabe que a mesma é prostituta na cidade grande. E muda o conceito quando ela mostra que ficou quase rica: – "ah, que susto cê me deu, meu amor, pensei que tu fosse protestante"...Tem aquela conveniência do medo, do cara que tenta puxar assunto com Lampião, o cangaceiro, só para não demonstrar o terror com a sua presença, e aponta um pobre e maltrapilho moleque: "que minino feio, né capitão?" - "Esse minino é meu afilhado", responde o caolho já com a mão na peixeira. - "Pense num feio bonito", comenta suando em bicas o frouxo.Mas a conveniência mais categórica vem da imprensa, que elege, deselege, mas não deixa de rezar na cartilha publicitária do poder. O retrato fiel da valentia efêmera e da bajulação em ascensão da mídia é aquele caso do jornal parisiense "Le Moniteur", narrando em manchetes a fuga de Napoleão Bonaparte e sua chegada para retomar o poder na França. São dez manchetes, em março de 1815, de pura conveniência e medo.Em 9 de março o anúncio da fuga: "O Monstro fugiu do local do exílio". No dia seguinte, "O ogro desembarcou em Cabo Juan". Dia 11, "O tigre apareceu em Gap. As tropas estão chegando de todos os lados para deter-lhe a fuga. A miserável aventura acabará em fuga nas montanhas". Dia 12, "É verdade que o monstro adiantou-se até Grenoble". Dia 13, "O tirano agora está em Lyon. O terror apoderou-se de todos que o viram chegar". Dia 15, "O usurpador arriscou-se a chegar a umas 60 horas da capital".E segue o valente jornal, já esquecendo os adjetivos pejorativos. Dia 19, "Bonaparte adiantou-se em marchas forçadas, mas é impossível que alcance Paris". Dia 20, "Napoleão chegará amanhã aos muros de Paris". Dia 21, "O Imperador Napoleão está em Fontainebleau". E finalmente, dia 22, a manchetona "Ontem à tarde, Sua Majestade o Imperador entrou solenemente em Paris e chegou ao Palácio. Nada pôde superar a alegria universal".Há uns quinze dias, um vereador que jurava amor a Garibaldi, encontrou-se com um deputado governista. "E aí, segundo turno é outra história, vamos conversar?". O outro prometeu sugerir a conversa à governadora. Dias depois, o vereador liga, "Rapaz, quero ser ouvido, todo mundo tá conversando". O deputado argumenta falta de "diálogo" e conclama à luta para futuros benefícios. "Home, eu quero conversar sobre meu apoio". Numa sexta-feira, o aviso: "O outro lado já está me acenando". Nada. O deputado diz que falta milho no terreiro. No sábado uma ameaça "Acho que vou declarar na imprensa meu apoio ao outro lado". O deputado responde que não pode fazer nada, além da proposta de promessa futura. Sai a pesquisa Perfil, oito pontos para Wilma, e o vereador ironiza, "estão de sapato alto, é? Tão pensando que pesquisa ganha eleição?". Silêncio do deputado.Aí chega à tarde do Ibope, os boatos se espalham, a Inter TV confirma. A governadora tem sete pontos na frente de Garibaldi. O vereador telefona para o deputado: "E aí, amigo, a carreata amanhã é aonde? Olhe, diga lá que eu tenho um carro de som disponível, viu?"O ser humano, de qualquer raça, cor, credo ou classe social, é sempre tudo igual, a imagem e semelhança de si mesmo. Todos nós vivemos dois papéis na vida, às vezes de garçom (para cobrar), às vezes de jornal francês (para vender-se).
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