Este texto me foi enviado via e-mail, e é perfeitamente o que penso e sinto por Jacko, até mesmo por que no post anterior sobre ele (no dia de sua morte) o chamei de pedófilo execrável, e hoje a coisa não é bem assim, as denúncias estão virando armações que usaram para ganhar dinheiro dele.
Peço desculpas pelo que escrevi, deixei-me contaminar pela sordidez midiática.
Mas vamos ao texto que é muito bem escrito e cheio de sentimento.
Michael Jackson está morto. Não é mais preto ou branco. Ele é o mundo. Na estrada desde os 5 anos, enfim ele descansa em paz. Cresci ouvindo-o nos Jackson Five. Eram ele e os outros quatro, além dos Beatles, lá fora, e a Jovem Guarda mais Simonal, aqui dentro. Foi essa minha trilha sonora naquele fim dos anos 60.
Seu solo em "Ben" me hipnotizava no dia em que morreu tanto quanto ao ouvi-lo pela primeira vez, centenas de execuções e quase 40 anos antes. Aquele triste garoto negro que encantava o mundo era eu.
Passada a adolescência, dele e minha, adveio a segunda e maior explosão. Em 1982, "Thriller" bateu todos os recordes com mais de 50 milhões de cópias vendidas mundo afora. Mais: o brilhante cantor virara eletrizante "performer".
Todo mundo tentou imitar diante do espelho seu "moonwalk", ninguém com a incompetência deste colunista. Sua combinação de blues, soul e pop foi reenergizada sob a batuta de Quincy Jones. A arte do videoclipe consolidou-se a partir da parceria entre ele e o cineasta John Landis para "Thriller". Ouvíamos música antes de Michael Jackson; a partir dele, também a vemos.
Jackson alegrava a festa, mas nunca parecia partilhá-la. Era insuficiente ter tanto talento. Não bastava ser rico. Ele queria ser outro. E assim se fez. Começava sua longa e pública agonia.
Primeiro, a metamorfose. Seu nariz afilou. O cabelo tornou-se liso. Seu queixo ganhou uma covinha. E sua pele clareou. "Vitiligo", diziam. Não surpreende que para meu filho, nascido em 1990, ele fosse uma bizarra figura do passado. Aquele Jackson garoto que parecia precocemente adulto se tornou um adulto obcecado em viver como criança.
"Sou Peter Pan no coração", repetia o cantor, enclausurando-se cada vez mais em sua Neverland, misto de rancho e parque de diversões. Sua incrível visão como empresário musical, ao comprar metade dos direitos sobre as canções dos Beatles, acabaria por sustentar sua extravagância mais do que as composições próprias. Por mais que tenha tentado, o extraordinário sucesso de "Thriller" nunca se repetiu.
Foi um choque quando espocaram rumores suspeitos sobre sua convivência com garotos. Um potencial processo custou-lhe em 1993 um acordo de milhões de dólares. Outro foi vencido no tribunal, uma década mais tarde, mas o derrotou definitivamente na arena pública.
Uma tentativa de reabilitação levou-o a colaborar com o repórter britânico Martin Bashir por oito meses no começo dos anos 2000. Foi- me duro resenhar para a "Folha" o documentário resultante, "Vivendo com Michael Jackson". Com inédita abertura, ele respondeu a dez horas de entrevistas de Bashir. A chave da esfinge lá estava para quem quisesse ver, em suas dolorosas revelações sobre a crueldade paterna.
Joseph Jackson não admitia ser chamado de "pai", ensaiava os filhos com um cinto de couro na mão e gozava as espinhas e o "nariz gordo" de Michael em plena puberdade. O mesmo nariz que o cantor finalmente reconhecia ter por duas vezes operado, para "respirar melhor" e "atingir notas mais altas".
Cinema, no qual Michael como ator sempre se deu mal, pode ser um meio cruel. Em palavras, por meio da narração de Bashir e das próprias respostas indignadas de Jackson, as acusações de pedofilia foram enfaticamente negadas.
Mas há as imagens. Eis um dos garotos que pernoitavam em Neverland, Gavin, de 12 anos, sendo entrevistado com as mãos entrelaçadas com as do ídolo. Ei-lo sorrindo para a câmera, encostando a cabeça no ombro de Jackson. Como escrevi na época, o espectro dessas cenas nos perturba até muito depois do filme.
Sempre achei pleno de simbolismo que Michael Jackson se tenha casado, ainda que brevemente, com Lisa-Marie, nada menos que a filha de Elvis Presley. Ambos foram ídolos que mergulharam para esticado declínio logo depois do apogeu. Ambos gravaram nos corpos o dilaceramento da alma. Por fim, nenhum sobreviveu até a hora da volta por cima. A diferença é que Jackson fez tudo isso na era da informação em tempo real. Sua verdadeira autópsia foi feita em vida.
O declínio e o escândalo ofuscaram por demais não apenas sua arte. Embranquecer nunca representou para Jackson um ato de negação de sua identidade étnica ou social. Foi, isso sim, sua dilacerante tentativa de parricídio. O astro pop redefiniu o status dos afro-americanos muito antes de Oprah Winfrey e Denzel Washington. Com a campanha We Are the World, que coproduziu e coescreveu em 1985, estabeleceu o padrão atual de militância cívica e cosmopolita dos artistas.
Barack Obama é o presidente dos Estados Unidos. Michael Jackson já podia partir para outra. Você olhou para cima na última semana? O homem finalmente voltou a andar na Lua
Por Amir Labaki, de São Paulo.
Vocês olharam pra lua hoje???
Michael Jackson está verdadeiramente andando nela...
moonwalking.
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