sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010
Lula é cúmplice.
Depois de ver na televisão o presidente Lula esbanjando sorrisos, felicidade plena, no seu encontro, em Havana, com o ditador Fidel Castro (foi uma conversa de duas horas) e acompanhar em seguida o noticiário nos principais jornais, resolvi passar a palavra para Clóvis Rossi, repórter especial e colunista da Folha de S. Paulo. Mas antes é bom recordar, olhando para o pessoal mais jovem, que Fidel Castro está no poder há mais de 40 anos. Não há liberdade de imprensa em Cuba, país de um jornal só, único. O do governo. Há mais de 40 anos não se realizam eleições na ilha.
A visita de Lula a Cuba (que coincidiu com a morte de um preso político que fazia greve de fome) e a sua conversa com Fidel Castro tem sido, desde quarta-feira, destaques na imprensa brasileira. Estão nas manchetes de ontem dos principais jornais. Deu na capa da Folha de S. Paulo: “Cuba reprime protestos da oposição na visita de Lula”. A manchete de O Globo foi: “Morte de dissidente abre onda de prisões em Cuba”. O título do artigo de Clóvis Rossi é “Quando o silêncio é cumplicidade”. Vai por inteiro:
- Não foi exatamente o melhor dia o escolhido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a sua quarta e última visita, como presidente, a Cuba.
- Primeiro porque, na antevéspera, morreu Orlando Zapata, dissidente do regime, defensor dos direitos humanos, operário como Lula o foi, após 85 dias em greve de fome. Segundo porque os dissidentes tentaram organizar manifestações para o enterro, mas estão sendo duramente reprimidos, conforme denúncia da Comissão de Direitos Humanos e Reconciliação Nacional, presidida por Elizardo Sánchez, um dos opositores mais respeitados internacionalmente.
- “Temos confirmadas ao menos 25 detenções e outras tantas prisões domiciliares, acompanhadas das ameaças de que quem sair de casa irá para a cadeia”, disse Sánchez.
- Para os dissidentes, a morte de Zapata foi “um crime premeditado” pela ditadura cubana. A reação das autoridades de tratar de bloquear o protesto até em um enterro que se dará a 830 quilômetros de Havana, a capital e por isso a grande câmara de eco em Cuba, só parece dar razão aos opositores.
- Torna menos emocional o desabafo de Oswaldo Payá, líder do Movimento Cristão de Libertação, segundo quem Lula é cúmplice das violações aos direitos humanos na ilha caribenha, em entrevista publicada pelo jornal “O Globo”. “Respeitamos e amamos o povo brasileiro, mas o governo Lula não deu nenhuma palavra de solidariedade para com os direitos humanos”, disse Payá, outro dissidente cuja voz alcança repercussão internacional.
- De fato, silenciar sobre violações aos direitos humanos, ainda mais quando persistentes, não deixa de ser cumplicidade.
- Dá para entender que não haja da parte de Lula uma crítica pública - como não houve, de resto, nos governos anteriores pós-redemocratização. A revolução cubana faz parte da memória sentimental da esquerda latino-americana. Um governo que tem raízes na esquerda, ainda que completamente abandonadas, presta homenagem póstuma a essa memória, por meio de seu silêncio. Explica-se, pois, mas não justifica o silêncio em conversas privadas.
- Não dá para aceitar que um governo democrático pareça dar aval a uma ditadura por ser de esquerda. Não há ditaduras de direita e de esquerda. Há ditaduras. Ponto. Não há direitos humanos de direita e de esquerda. Zapata, se tivesse sido brasileiro nos anos 70, talvez aderisse à luta pelos direitos humanos e, hoje, estaria sendo homenageado por membros do governo Lula. Morre em Cuba, e o governo Lula fez silêncio.
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