Leio na Folha de S. Paulo artigo do historiador norte-americano, Kenneth
Serbin, sobre dom Eugenio de Araújo Sales. Ele é professor da
Universidade de San Diego, na Califórnia, membro da Braza (Brazilian
Studies Association), com sede nos Estados Unidos, e autor dos livros
Diálogos na sombra: bispos e militares, tortura e justiça social na
ditadura e Padres, celibato e conflito social, publicados pela Companhia
de Letras. No primeiro, Kenneth Serbin estuda (e faz revelações
importantíssimas) sobre a relação da Igreja Católica com a cúpula
militar durante a ditadura. Para o texto de Serbin, a Folha deu o título
de “Análise: O último dos bispos-políticos exerceu liderança civil e
religiosa”. Transcrevo-o por inteiro:
“Personagem mais poderoso
da Igreja Católica do Brasil moderno, dom Eugenio de Araújo Sales ajudou
a moldar tendências fundamentais e, com o seu estilo direto, gerou
muita controvérsia.
Nos anos 50 dom Eugenio, com outros
religiosos progressistas e leigos do Nordeste, promoveu transmissões de
rádio para alfabetizar a população pobre que deram origem ao MEB
(Movimento de Educação de Base). O MEB foi reprimido após o golpe de
1964, mas seu espírito sobreviveu nas conhecidas Comunidades Eclesiais
de Base.
Embora intelectuais e religiosos de esquerda tenham
criticado dom Eugenio por seu suposto apoio à ditadura, suas ações
frequentemente demonstram o contrário. Como administrador apostólico de
Natal em 1964, ele foi um dos poucos bispos nas capitais a proibir
comemorações religiosas de apoio ao golpe.
Enquanto progressistas
como dom Hélder Câmara e dom Paulo Evaristo Arns denunciavam
publicamente a tortura e a censura impostas pelo governo militar, dom
Eugênio usava o respeito enorme que ele usufruía entre os generais –
como resultado do seu anticomunismo e da ênfase na obediência à
hierarquia – para defender os direitos humanos nos bastidores.
Apesar
de ter ajudado a criar a ala progressista da igreja, nos anos 80 dom
Eugênio – já interlocutor regular do Papa e membro de comissões
importantes do Vaticano – usou seu poder para reverter partes
fundamentais do movimento progressista. Ele supervisionou grande parte
do esforço para reduzir o radicalismo da Teologia da Libertação e de
seus adeptos no país e na América Latina.
Ao final, dom Eugênio
será lembrado por seu patriotismo, sua defesa dos interesses da Igreja e
suas habilidades políticas. Sua morte sinaliza o fim de uma época em
que bispos-políticos ocupavam papéis importantes de liderança no mundo
religioso e público. Com o declínio do catolicismo e a transição para
uma sociedade mais consumista e menos centrada no sagrado, é pouco
provável que o Brasil voltará a ter indivíduos com tanto poder,
prestígio e influência moral.”
quinta-feira, 12 de julho de 2012
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