Mesmo feia, velha e de difícil canto, a canção “Acorda Amor”, de Chico Buarque, me parece mais que contemporânea nestes tempos de governo Lula alicerçado no cinismo e na cumplicidade midiática, de Congresso podre e de juizes trocando desaforos sinceros.
O Brasil está de marcha batida para a barbárie institucional, para o confronto social e para a inversão dos valores republicanos. Após o fracasso de três décadas com um arremedo de democracia, a Nação falhou, perdeu o prumo, equivocou-se.
E o retrato fiel de tudo isto é a atual conjuntura de terceiro mundo, com um povo imbecilizado pela falência da Educação, uma classe média iludida na sua cultura de TV e folhetins e uma imprensa se imaginando agente político de transformação.
A Folha de S. Paulo publicou que o “Congresso tem sido palco de um espetáculo de desmoralização capaz de fazer sombra a qualquer outro escândalo já registrado no prontuário da vida parlamentar”. Só esqueceu de botar cartas para quatro.
Grande parte da chamada “grande mídia” não apontou suas metralhadoras e suas bombas incendiárias para o poder Executivo, para o Judiciário e nem para o próprio umbigo. Há indícios fortes e históricos para a equivalência nos deslizes ético e moral.
Passou da hora das canhoneiras apontarem o poder bélico para o que ocorre também do lado de fora do Legislativo. É preciso usar a matemática e descobrir que os volumes e valores dos escândalos no Executivo e noutras paragens são até maiores.
Os deputados Fernando Gabeira (PV) e Ciro Gomes (PSB) tocaram num tabu que urge ser derrubado no Brasil: o poder da publicidade oficial nas redações da grande imprensa. Gabeira disse que o Congresso apanha “porque não é bom de anúncio”. Ops!
Já o deputado cearense, mesmo descontando-se o pavio falastrão, também foi no mesmo diapasão e acusou nominalmente Folha, Globo e outros pela inquisição concentrada apenas no Poder Legislativo. A podridão dos demais não sai nos jornais e televisão.
Talvez esteja aí o epicentro invisível do bate-boca entre os ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, que fizeram do Supremo uma versão das rinhas de galo dos tempos de Jânio Quadros, ou tão somente uma discussão típica de botecos.
O que queria dizer Barbosa sobre Mendes sair às ruas? Por que Mendes disse que Barbosa não pode dar lição de moral a ele? Entre as muitas conversas das ruas e dos corredores, há relatos sobre Daniel Dantas e peladas de futebol numa certa mansão de Brasília.
E pensar que o grosso da crise institucional entre 1961 e 1964, foi basicamente apenas algumas greves de marinheiros, umas passeatas de imberbes estudantes e uma vice-presidência na mão de um cunhado de um pretenso comunista pequeno-burguês.
Estamos á deriva ou é apenas uma ilusão psicológica, um exagero na análise? O País está num processo de insegurança constitucional, num paradoxo institucional que inverte os valores de uma democracia ocidental. O princípio da autoridade sumiu.
Nas periferias das cidades, as pessoas ainda contam com a proteção das quadrilhas do tráfico, que felizmente ainda não subverteram a ética própria do solo sagrado de suas comunidades. E o resto, a quem deve apelar? Quem detém a verdadeira moral?
E se a nós não é permitido chamar o ladrão, como Chico Buarque ou os cidadãos das favelas, só nos resta o sobressalto dos escândalos de cada dia e o grito particular que não mobiliza o coletivo: acorda, amor, eu tive um pesadelo agora.
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